Theresa May e a incerteza no acordo para o Brexit

Em um cenário sem acordo negociado para viabilizar o Brexit, o Reino Unido permanece a mercê do declínio econômico, político e social. Faltando menos de um mês para a conclusão do acordo que estabelece os termos do “divórcio” entre União Europeia e Reino Unido, é alarmante o quadro em que o país se encontra – evidenciando assim os riscos societais, políticos e econômicos.

Com o impasse claro para estabelecer tal acordo, na reunião do Conselho Europeu que aconteceu na última semana, foi comunicado a rejeição por parte da União Europeia aos termos propostos pela primeira-ministra britânica. Líderes de países da União Europeia levantaram a hipótese de um novo referendo britânico que, pudesse anular o Brexit. A primeira ministra Theresa May, em um comunicado oficial negou um novo referendo e confirmou que seu governo tem como prioridade estabelecer um acordo, embora exista a possibilidade de saída do bloco sem que tal negociação aconteça e, devido à este fato, as especulações ganharam ainda mais força nas últimas semanas [1].

No entanto, May segue convicta com relação à separação do Reino Unido da União Europeia, embora exista um grande descontentamento da população que atualmente se encontra mais consciente dos impactos oriundos da saída do bloco. Neste sentido, o referendo a favor da retirada do país da organização que, aconteceu em 2016, hoje evidencia a falta de informação dos ingleses na época, que não compreendiam as dificuldades que isso traria para o Reino Unido.

Tendo em vista que Theresa May, assim como seu partido (Conservador), ganhou forças com o discurso pró-Brexit, caso um novo referendo aconteça e a população vote a favor da anulação do “divórcio”, a primeira-ministra perde o até então único instrumento legítimo que tinha a seu favor e, consequentemente, perde também o apoio doméstico e internacional. Os dois principais partidos do Reino Unido estão conjuntamente em crise, atormentados por lutas faccionais, preocupados com os desafios da liderança e divididos pelas direções futuras do país. Vinte deputados britânicos pró-Brexit também declararam que votarão contra o acordo Chequers – nome dado ao acordo apresentado por May – com a facilidade de descaracterizá-lo.

Advindo da insegurança e aflição interna, além das divergências políticas e parlamentares causadas pelas desavenças entorno do Brexit, a primeira-ministra corre o risco de não terminar seu mandato, visto que o Parlamento, descontente, pode seguir com uma moção de censura que retira May de seu cargo. Esse cenário se torna ainda mais possível uma vez que seu antecessor David Cameron, também do Partido Conservador, renunciou por conta dos mesmos problemas que May enfrenta hoje em seu mandato.

Como está impossível prever qual o futuro do país, há frustrações para os europeus que residem no Reino Unido e de britânicos que residem na Europa. Com a falta de uma definição clara a respeito da circulação entre os povos, é provável que entre 2019 e 2020 o Reino Unido enfrente uma onda emigratória maior que a que ocorreu em 1994, a última vivenciada pelo país [2], que pode vir a expulsar os europeus que não tiverem visto regulamentado e, como resposta, a União Europeia pode fazer o mesmo com os britânicos que residem nos países que pertencem a organização. A fronteira com a Irlanda do Norte é o maior problema que os britânicos enfrentam no acordo. A livre circulação entre os dois povos faz parte de um acordo de paz entre as duas nações e, uma vez que a Irlanda continuará na União Europeia, não se sabe qual será a resolução dessa questão.

Apesar das medidas de contingência que vem sendo tomadas pelo país, sair sem um acordo, é como se o país estivesse abdicando de seus direitos e feitorias dentro da UE. É retirar-se sem nada concreto. Além de colocar em risco o progresso substancial que o Reino Unido fez nos últimos dez anos na reparação da economia.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) comunicou receio quanto a maneira em que o Brexit está sendo guiado – uma crítica ao governo de Theresa May, que vem sendo pertinente quanto suas vontades. Uma saída “desordenada” ou “violenta” da UE teria uma série de consequências ao Reino Unido, incluindo crescimento reduzido, aumento do déficit comercial e depreciação da libra esterlina, o que levaria a economia do país a uma redução drástica, afirmou Christine Lagarde, diretora-gerente do FMI [3]. O governador do Banco da Inglaterra, também alertou o gabinete de Theresa May de que o Brexit sem compromisso poderia levar ao caos econômico, incluindo uma queda nos imóveis que, poderia fazer os preços das casas caírem em um terço. O colapso da propriedade seria impulsionado pela alta no desemprego, crescimento reduzido, inflação e taxas de juros mais altas, alertou Carney [2].

A incerteza generalizada para o Reino Unido e as dúvidas acerca da problemática, revela um governo frágil e inseguro quanto as suas decisões. No âmbito econômico, acordos comerciais e de trabalho, tanto domésticos quanto internacionais, terão que ser revisados, visto que as normas contratuais que conduzem a Europa por meio da organização, não se aplicarão mais ao país. Novas leis, regras, normas e tratados deverão ser arquitetadas e implementadas. As consequências desse momento também farão parte do cenário de países de dentro e fora da União Europeia. A instabilidade gerada pelo acumulo dessas condições, fizeram com que atores econômicos se posicionassem frente ao divórcio UE-Reino Unido; alguns bancos já alertaram que consideram sair do país caso o acordo não os beneficie. Com a crescente probabilidade do afastamento de atores como, investidores, financiadores, empresas e bancos, o risco econômico britânico aumentaria de forma substantiva.

Para a União Europeia, embora existam elementos positivos na proposta feita pelo governo britânico, a estrutura sugerida para a cooperação econômica não funcionará, até porque arrisca prejudicar o mercado comum [4]. A organização espera um progresso significativo do acordo, no Conselho Europeu que acontecerá nos dias 17 e 18 outubro. Ambas as partes têm como prazo até a segunda semana de dezembro para concluir um acordo, que caso não se efetue, a saída do Reino Unido da União Europeia acontecerá independentemente [5].

É importante ressaltar que nenhum acordo será tão bom quanto o processo sob o qual bens, serviços, pessoas e capital circulam entre a UE e o Reino Unido sem impedimentos e obstáculos. Tendo isso em perspectiva, é possível afirmar que o cenário ideal para o Reino Unido é a permanência na organização. Qualquer cenário quanto ao BREXIT vai acarretar “custos significativos” para a economia britânica e para seus cidadãos.

*Agradecimento ao Prof Dr. Demetrius Pereira pela contribuição.

REFERÊNCIAS

[1] EL PAÍS. UE adverte May que seu plano para o ‘Brexit’ é inaceitável. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2018/09/20/internacional/1537445005_999903.html Último acesso em: 26/09/2018.

[2] FINANCIAL TIMES. Mark Carney warns of economic chãos in no-deal Brexit. Disponível em:  https://www.ft.com/content/984b15e0-b76b-11e8-bbc3-ccd7de085ffe Último acesso em: 26/09/2018.

[3] BBC. No-deal Brexit would hit UK economy, says IMF. Disponível em:  https://www.bbc.com/news/business-45546785 Último acesso em: 26/09/2018.

[4] REUTERS. EU leaders comments on Brexit at informal summit in Austria. Disponível em:  https://www.reuters.com/article/us-eu-summit-highlights/eu-leaders-comments-at-informal-summit-in-austria-idUSKCN1M00VT Último acesso em: 26/09/2018.

[5] BBC. Brexit: Key dates and potential hurdles. Disponível em:  https://www.bbc.com/news/uk-politics-44374613 Último acesso em: 26/09/2018.

Beatriz Amaral

Beatriz Amaral Analista Júnior Bacharelanda em Relações Internacionais

Luísa Lotto

Luísa Lotto Analista Júnior Bacharelanda em Relações Internacionais

Caio Nielsen

Caio Nielsen Analista Júnior Bacharelando em Relações Internacionais